Crônica-dor de domingo para um segundo: Segunda mais feliz.

Um dia ela acordou, se olhou no espelho e resolveu mudar. Pintou os olhos com maquiagem bem escura, colocou os longos cabelos dentro do chapéu,calçou salto alto ,vestiu um antigo vestido de bolinhas e saiu a caminhar sem rumo, naquela bela manhã de domingo.
Não sabia o que procurava,não sabia o que pensar, mas de algo tinha certeza: As ruas de pedra por onde o salto fino se equilibrava, faziam-a um pouco mais mulher e os olhos com que cruzava, mais humana.
Parada em um cruzamento de ruas: Um cachorro na outra esquina, um mendigo na sargeta, um carro passando disparado, cortando o vento e levantando seus cabelos...Veio uma vontade súbita de atravessar,sem pena de si,arrancando a lentidão do peito sentimental.
Ela não tinha como voltar, era outra, o lugar de antes já não cabia dentro dela, a poça de água no chão de asfalto refletia a nova mulher, o claro do dia abriu a visão do obscuro. E a noite chegou, e ela sem pressa, travessa, atravessa o rumo dos seus dias, e as ruas que por aí virão.
Pintou a cidade com a cor dos seus olhos,colocou as longas crenças dentro do chapéu,calçou as confortáveis sandálias de vento e vestiu o novo traje de si mesma, e continuou a caminhada, naquela bela manhã, de um claro domingo, de uma semana qualquer, numa cidade distante, num beco sem saída, numa casa sem numéro, onde estava ela,intacta,na cama de sonhos.
*Imagem: "Caminho Tortuoso" de Osvaldo Luiz Pastorelli.